Os médicos sempre falam de um futuro
onde o câncer será tratado de acordo com características moleculares, e não por
causa do local em que surgiu. Eis que, na semana passada, uma notícia tornou
esse futuro uma realidade, o que abre as portas para uma Oncologia ainda mais
personalizada e efetiva.
A FDA (Food and Drug Administration),
agência reguladora americana, aprovou pela primeira vez na história um
medicamento com base em alterações biológicas do tumor. Isso significa que,
desde que a doença apresente essa particularidade — já falaremos dela —, pode
receber a droga, independentemente se está na mama, no intestino, no pâncreas,
na pele.
“Todas as indicações anteriores se
baseavam no órgão afetado. A revolução está no fato de que um aspecto molecular
do câncer, descoberto com exames relativamente simples, foi priorizado”,
contextualiza o médico Jacques Tabacof, coordenador geral da Oncologia Clínica
e da Hematologia do Centro de Oncologia do Hospital Alemão Oswaldo Cruz, em São
Paulo.
Na prática, a medicação — chamada de
pembrolizumabe, da farmacêutica MSD — poderá ser empregada em quaisquer tipos
de tumor avançado que não respondam aos tratamentos convencionais. Isso, claro,
desde que a doença possua a tal alteração, presente em 5% de todos pacientes.
Ainda é pouca gente, mas a perspectiva de termos mais armas que atuam em várias
frentes é certamente positiva aos pacientes, principalmente entre os que, hoje,
têm um arsenal exíguo à disposição.
Outra coisa: o Brasil ainda não
aprovou o pembrolizumabe para esse fim. Por aqui, ele só é empregado contra o
melanoma, uma versão especialmente agressiva de câncer de pele. Nos Estados
Unidos, mesmo antes dessa novidade, o princípio ativo já vinha sendo usado
contra linfoma de Hodgkin e nódulos no pulmão.
Por dentro do câncer… e da aprovação – A tal característica molecular que define o uso ou não do
remédio se chama instabilidade de microssatélite. Não fique com medo do nome
complicado: “Trata-se de uma alteração na célula que dificulta reparos no nosso
DNA”, explica Tabacof, que também atua no Centro Paulista de Oncologia (CPO).
Com isso, uma mutação perigosa que normalmente seria consertada segue incólume
e pode originar um câncer.
Acontece que essa particularidade
torna a moléstia, digamos, mais vulnerável à ação do pembrolizumabe, um
medicamento pertencente ao grupo da imunoterapia. O remédio, na verdade,
estimula as células de defesa do próprio organismo a identificarem o câncer e o
atacarem.
“Embora tenha chamado a atenção
ultimamente, a droga não é a única a seguir esse princípio. É possível que, no
futuro próximo, outras farmacêuticas busquem aprovações similares com seus
imunoterápicos”, raciocina Tabacof. Seguindo essa lógica, talvez nos próximos
anos mais fármacos sejam liberados para atuar em diversos tipos de câncer.
Entendeu quão relevante é a decisão da FDA?!
Segundo estudos que garantiram a
aprovação, quase 40% dos voluntários envolvidos observaram uma melhora objetiva
ao tomar pembrolizumabe — isso mesmo após outros tratamentos terem fracassado.
Do pessoal que apresentou uma evolução no quadro, 78% mantiveram os benefícios
por seis meses ou mais.
Ainda assim, é importante dizer que
a liberação da agência americana foi tomada com base em pesquisas preliminares.
Em outras palavras, os resultados foram considerados promissores ao ponto de
sustentarem a comercialização do pembrolizumabe para esse fim — mesmo sem
levantamentos maiores e mais abrangentes. Novos trabalhos irão delinear com
maior clareza o potencial real do princípio ativo da MSD.
De qualquer maneira, a aprovação de
uma medicação que prioriza mutações no câncer em vez do órgão afetado já
balançou os alicerces da Oncologia. Resta quantificar qual a real magnitude
dessa quebra de paradigma para os pacientes.
(Fonte: Revista Saúde)
(Foto: Internet)
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